Por Ana Clara Montenegro

Muitas palavras nos instigam ao movimento: vem, vai, junto, abraço, quero, faço, desejo, perigo, deleite.

Quando as escuto, meu corpo responde com algum gesto. Quando as digo em voz alta, minhas mãos e braços se movem junto com a boca. Meu próprio movimento me conta novas informações sobre o que quero dizer.

Meu corpo e minha mente não estão separados. Essa é a percepção do trabalho de corpo, ou trabalho somático.

Trabalho de corpo não é o mesmo que atividade física ou técnicas de meditação e terapia - embora possa estar presente em todos estes. É desenvolver uma percepção mais aguda de si mesmo e reconhecer padrões e tendências no corpo. É perceber que somos não apenas uma racionalidade pensante, mas um corpo, uma matéria que conta histórias e cria futuros.

Sabe a sensação do coração palpitando antes de uma entrevista importante? Ou ao conhecer alguém que nos tira do eixo? Sabe quando é impossível controlar uma risada ou um susto? Esses são momentos em que, nitidamente, o corpo fala. E o trabalho de corpo é o processo de reconhecer esses padrões de movimento, ação física e resposta corporal, tanto em suas versões mais gritantes quanto nas mais sutis.

Anatomicamente, é compreender e experienciar o funcionamento dos nossos sistemas. Desde a função dos ossos e músculos, que nos dão estrutura e criam formas à medida que o corpo ocupa espaço, até as variações do sistema nervoso, com seus estados de calmaria e ativação. Nosso trabalho - de corpo - é viver cada detalhe desses sistemas de forma integrativa, prazerosa e curiosa. É a partir daí que passamos a nos compreender por inteiro: somos corpo ao mesmo tempo que somos mente, temos sensações na mesma medida que temos pensamentos e ideias.

Na vida contemporânea, esse processo pode ser desafiador. O excesso de atividade, as responsabilidades, a obrigação de produzir respostas para o mundo externo, são fatores que afastam a nossa atenção dos estados corporais e nos levam a dissociar corpo e mente. O problema é que, no momento em que dissociamos, silenciamos o corpo. Silenciamos a nós mesmos.

Então o trabalho de corpo chama para o processo contrário.

Se reconhecer:

Imagine ser capaz de reconhecer as sensações corporais de tal modo que não é preciso temê-las. Como seria ter tamanha consciência sobre o próprio corpo que todas as pequenas ações são sentidas antes das grandes? Os prazeres e os desconfortos, as potências e os cansaços. Quanto disso não mudaria a sua sensação, as suas ações e reações, também numa escala macro?

Não é um trabalho fácil e, muitas vezes, assusta. Nos assustamos ao perceber as sensações escondidas por trás das camadas de pele, músculos e ossos. Mas é ao lidar com isso que o corpo se fortalece. É nessa escuta - atenta, corajosa e amorosa - que reconhecemos quem somos para além do óbvio.

Um exercício para ativar essa escuta:

  • Busque a imagem de alguma parte do corpo que lhe desperte interesse: olhos, coração, quadril, mãos, pés, cabeça, ventre — qualquer parte que traga curiosidade. Primeiro, observe os detalhes dessa imagem, como você a vê? Tente observar sem julgamentos.
  • Depois de alguns minutos, feche os olhos e tente sentir essa parte do corpo. O que é esse corpo que está para além do visual? Esse corpo que é sensação? Dê atenção a como essa parte sente.
  • Tire alguns minutos para mover o corpo a partir dessa sensação. Você consegue expandir essa atenção para outras partes do corpo? Será que é possível dançar a partir da sensação?

Dicas da Ana:

Para se aprofundar em conhecimentos somáticos, vale pesquisar Klauss Vianna, Body Mind Movement, Feldenkrais, Klein Technique, Body Mind Centering, entre outras modalidades. Também indico a leitura de Gabor Maté, médico que entende o corpo de forma holística. E, para quem é do Yoga, o trabalho de Navtej Johar, professor e pesquisador indiano que traz a abordagem somática tanto em teoria quanto em prática.